Ocidente pós-Iconomaquia: da "Idade das Trevas" à Partilha da Grécia Bizantina (sécs. X-XIII)


Estados sucessores do Império Bizantino, início do século XIII. Em tons de roxo vemos o Império Latino do Oriente e seus vassalos, o reino de Tessalônica, o principado de Acaia e os ducados de Atenas e do Arquipélago. As posses obtidas por Veneza na partilha bizantina, em verde, eram independentes do Império de Balduíno de Flandres. Em vermelho se encontram os Estados Bizantinos que se alegaram continuações ou sucessores do Império Bizantino, formados por generais de fronteira ou aristocratas gregos que conseguiram preservar sua independência. 

O Império de Niceia destacar-se-ia dentre todos e, em 1261, Constantinopla seria reconquistada em uma infiltração surpresa de tropas nicenas, encontrando pouca resistência da guarnição latina e sendo aclamados pela população nativa. O Império Bizantino que encontrou seu fim em 1453, com a conquista turca, descende desta facção. 

Quando a resistência carolíngia à iconodulia foi redescoberta no século XVI, a apologética romanista procurou negar, relativizar e adulterar a interpretação das evidências o melhor que pôde. Antes do surgimento ridiculamente recente de acadêmicos católicos com honestidade ou com a obrigação de fazerem estudos históricos profissionais, a militância romanista alternava entre graus de negacionismo e graus de uma medíocre concessão dissimulada, buscando apenas o controle de danos da situação [i]

É pelo expediente do controle de danos que, mesmo cedendo à uma batalhada admissão, ainda persista a suposição de que "a fé de sempre" logo se tornou regra aonde ela não era "a fé de sempre" [ii]. É tudo uma questão de fronteira: para quem admitia que o Libri Carolini era verdadeiro, os carolíngios foram iconistas até o Papa corrigí-los triunfantemente, seguindo-se uma adequação geral; para quem admitia que o Concílio de Frankfurt (794) era verdadeiro, a conformidade à iconodulia foi um pouco mais tardia, mas ainda assim imediata; o mesmo princípio para o Concílio de Paris (824) e as últimas reações registradas do século IX. 

Diversas fronteiras para a transição do anti-iconodulismo carolíngio à iconodulia transalpina têm sido propostas, todas puramente especulativas, mergulhadas em wishful thinking, quando não nitidamente mentirosas [iii]. O domínio prático da Igreja Romana sobre a história foi tão persistente que até a obra não-confessional de Philip Schaff (1819-1893), historiador protestante, ecoa as aspirações papais da História dos Dogmas:

"Jonas de Orleans, Hincmar de Rheims e Wallafrid Strabo ainda mantiveram substancialmente a atitude moderada dos livros carolinos entre os extremos de iconoclastia e culto de imagens. Mas a influência toda-poderosa dos papas, a tendência sensual e a credulidade da época, a ignorância do clero e a ignorância mais grosseira do povo combinaram-se para garantir o triunfo final do culto às imagens, mesmo na França. O sol nascente da era carolíngia foi obscurecido pela escuridão do século X" [1]. 

Por mais que os nossos tratados carolíngios sobre imagens de fato se encerrem no século IX, sob um olhar mais clínico e profissional, é temerário e indevido simplesmente supor que a França e a Alemanha sucumbiram à uniformidade iconódula no século X, seja pela ausência de oposição franco-germânica ao culto, seja por se desconhecer atritos registrados na época; se é necessário atestar, a alegação da Enciclopédia Católica de que a tradução corrigida de Anastácio Bibliotecário foi um marco para conformismo é simplesmente falsa e incoerente [2].

O século X parece ter um magnetismo próprio na medida em que até apologistas romanistas, como o cardeal César Barônio (1538-1607), falaram de uma "Idade das Trevas" nesta epoca. Os registros sofrem uma dura queda, em alguma medida puxados pela Fragmentação do Império Carolíngio (888), até inícios de revitalização no século XI. É o buraco negro ideal para supor uma transição: até porquê, dificilmente encontrariamos um historiador que negasse uma unidade doutrinal no assunto de imagens nos tempos de cavaleiros e de cruzadas. Ainda assim, isso é tomado com base em escassez documental. 

Embora nenhum estudo tenha se dedicado à recolher seriamente as evidências totais para os séculos X e XIII, é possível recolher organizar o que temos disperso. A redescoberta e divulgação dos tratados de João Damasceno em meados do século XII acabaram forçando entrada na apologética de escolásticos como Tomás de Aquino (1224/5-1273) e Philippe le Chancelier (1160-1236), que se forçavam a defender todas as doutrinas de sua denominação. Podemos, então, falar de uma generalidade iconódula no século XIII? Uma visão mais atenciosa às fontes pode contestar tal suposição.


O CHOQUE RELIGIOSO ENTRE OCIDENTAIS E GREGOS PROMOVIDO PELAS CRUZADAS 

A apresentação da História Mediterrânea da Igreja tem se limitado à citar o decreto iconódula do Segundo Concílio de Niceia (787) como o ato final da Igreja Una; segue-se para a narrativa de separação entre a Igreja Ocidental, sediada em Roma, e a Igreja Oriental, representada por Constantinopla, no Cisma do Oriente (1054); até os adventos da Primeira Cruzada (1095-1099) e da Quarta Cruzada (1203-1204), culminando no Saque de Constantinopla e de um aprofundamento no Cisma.

Apesar dos erros, pormenores e reducionismos deste tipo de apresentação, estes três eventos de fato são bastante significantes na relação Oriente-Ocidente. Embora contato entre bizantinos e os povos do Ocidente nunca tenha sido totalmente cortado, são as Cruzadas que vão intensificar um relacionamento que antes limitava-se somente à conflitos de fronteira e recrutamento de mercenários.

É o desfecho da Quarta Cruzada que desempenha o maior destaque neste estudo: porque é justamente o Saque de Constantinopla (1204) que abre a possibilidade visível de uma incorporação do Império Bizantino à Igreja Católica. Com o trono imperial vago e a capital tomada, os altos barões logo perceberam que todo o Império estaria à prêmio, bastando fazer a repartição devida. É claro que o plano não contava com a resistência de generais nativos e dos conflitos com o Império Búlgaro, limitando seu sucesso, mas a verdade é que as ilhas gregas e boa parte da Grécia continental foi conquistada pelos participantes da Quarta Cruzada. A frankokratia e a latinokratia estabeleceram uma organização feudal com cavaleiros e barões, promoveram uma tentativa de imposição do Romanismo nas igrejas melquitas locais e, principalmente, uma interação social, comercial e religiosa mais intensa entre bizantinos e ocidentais, séculos após uma convivência relativamente remota. 

É neste período que veremos a primeira recepção grega à Tomás de Aquino e Agostinho de Hipona, traduzido aos grego contemporâneo; e ao contrário da atual Igreja Ortodoxa, que despreza ambos os autores e até concorda com alguns filósofos calvinistas que Tomás teria posto bases de racionalização e descristianização da fé, bizantinos contemporâneos abraçaram ambos os autores com grande estima. Além dos debates modernos como o Filioque, e de outras diferenças doutrinais, um aspecto ainda pouco desenvolvido é o choque iconólogico entre as duas matrizes religiosas; o que é no mínimo um pouco esquisito, considerando que a iconodulia foi uma doutrina comum afirmada por ambas as religiões. 

Vemos em Geoffrey de Villehardouin, cavaleiro francês e cronista da Quarta Cruzada, alguns indícios de percepções negativas quanto ao uso bizantino de imagens: ao narrar uma importante batalha do Cerco de 1204, Sir Geoffrey limita sua descrição à:

"Com a ajuda de Deus, o imperador Mourzuphles ficou frustrado e quase foi levado cativo; e ele perdeu sua bandeira imperial e um ícone que foi posto antes dele, no qual ele e os outros gregos tinham grande confiança — era um ícone que representava Nossa Senhora — e ele perdeu pelo menos vinte cavaleiros das melhores pessoas que ele tinha." [3].

É esse o mesmo ícone que o Papa Inocêncio III descreve, na Constantinopla ocupada, como alvo de uma condenável iconodulia dos habitantes locais, de acordo o padre Ludovico Muratori:

"Os gregos mantinham uma honra exageradamente alta para uma pintura da Mãe de Deus que eles acreditavam ter sido pintada por São Lucas, pois este tolo e estúpido povo pensava que o espírito da mãe divina vivia dentro da imagem; cuja opinião sem-sentido foi rapidamente condenada pelo Papa Inocêncio III. De tudo o que eu sei, tais erros podem ser praticados por outros dos fiéis que prestam uma atenção inordenada à tais imagens" [4].

É interessante notar que o padre Muratori, ao qual Hans Belting descreve como iluminista, afirma que a iconodulia supracitada foi condenada pelo papa Inocêncio III por prestarem "uma honra exageradamente alta" e por uma crença que, embora possa ser pressuposta como superstição popular de época de as imagens são o próprio Deus ou santo representado, na verdade se configura em doutrina oficial da Igreja Melquita, conforme descrito pela Sacra Arquidiocese de Buenos Aires:

"Para o Oriente, o ícone é um dos sacramentais, mais precisamente da presença pessoal. Nas Vésperas da Festa de Nossa Senhora de Vladimir sublinha-se: «contemplando o ícone, tu dizes com poder: minha graça e minha força estão com esta imagem.» É por isso que é necessário que o ícone seja abençoado por um padre, para que se lhe confira o caráter teofânico. O ícone estará cheio de presença, será uma testemunha autêntica e o «canal da graça à virtude santificadora» (São João Damasceno). O Concílio de 860 afirma a mesma coisa: «O que o Evangelho nos diz através da palavra, o ícone nos anuncia através das cores e o torna presente para nós.»
[...] 
Certamente o ícone não tem realidade própria; em si, ele é somente uma prancha de madeira; é justamente porque ele tira todo seu valor teofânico de sua participação na Trindade, no «todo outro» por meio da semelhança, que ele não pode encerrar nada nele mesmo, mas irradia como que por irradiação esta presença.
 [....]
É esta teologia litúrgica da presença, que distingue absolutamente um ícone de um quadro religioso qualquer e faz a linha de demarcação entre os dois. " [5]

Enquanto a Igreja Melquita têm uma teologia do ícone definida, o Ocidente é completamente confuso: quase nenhum católico sabe dizer se a Igreja afirma ou condena a doutrina da presença nos ícones. Na verdade, a maioria têm uma teologia tão racionalizada de iconologia que ela desemboca ou em iconismo factual ou em uma iconodulia tão desidratada que soa meramente cerimonial. Nega-se, se desconhece ou se constata indecisão até para assuntos mais básicos, como o papel da imagem sacra como, de fato, sacramental (o próprio termo "imagem sacra" foi esvaziado como uma mera referência à temática religiosa), ao qual um católico dificilmente encontra um material que indique claramente se é ou não é, quase como se catequistas e teólogos tivessem vergonha de admitir — somente o crucifixo é mencionado de forma meio vaga no meio de um grupo de sacramentais.

Um exercício que eu frequentemente proponho é comparar a teologia da presença melquita com a atual iconologia romanista, e perguntar para um romanista se é a Igreja Melquita que adicionou algo à fé ou se a Igreja Romana subtraiu algo, sendo tanto a adição quanto a subtração condenáveis e anatemizadas em Niceia II — isso de forma geral, quiçá quando no próprio assunto da iconodulia. A resposta é sempre "a Igreja Ortodoxa que adicionou", com uma minoria admitindo que isso é apenas o que se espera sendo um fiel romanista. Mas isto não só revela um problema fundamental ou com uma Igreja, ou com outra, revela um problema fundamental com a Iconodulia, que mesmo assumindo sua imutabilidade pré-concílio ou tendo este como ponto de partida, prova-se corruptível; mostra também um problema fundamental com Niceia II, concílio comum de ambas as seitas, em virtude dessa corrupção ser incompatível com seu imutabilismo fantasioso; e revela ser um problema para o Magistério e Tradição, que não se provam infalíveis.

É claro que um romanista poderia se escorar encima da condenação de Inocêncio, assim como um romanista que desidrata autoridade se recusaria a assentir à condenação por não ser ex-cathedra; considerando que alguns limitam o uso da infalibilidade papal à 2 ocasiões, não surpreende que haja uma verdadeira Torre de Babel no assunto. 

Os termos que De Villehardouin usa, "na qual tinham grande confiança" pode ser facilmente interpretado como idolatria: e não precisa ser uma leitura protestante, o próprio decreto do Concílio de Trento cita esse vocabulário como uma atitude heterodoxa:

"Quanto às Imagens de Cristo, da Santíssima Virgem e de outros Santos, se devem ter e conservar especialmente nos templos e se lhes deve tributar a devida honra e veneração, não porque se creia que há nelas alguma divindade ou virtude pelas quais devam ser honradas, nem porque se lhes deva pedir alguma coisa ou depositar nelas alguma confiança, como outrora os gentios, que punham suas esperanças nos ídolos" [6].

De Villehardouin credita certamente algo de reprovável no tratamento bizantino daquele ícone, algo que curiosamente se enquadra dentro da reprovação conciliar e ecoa em Inocêncio. Mas, existe talvez um aspecto essencial ignorado aqui: estamos simplesmente assumindo que o Papa e De Villehardouin são iconódulas, por uma consideração temporal e regional. Em 1200, quase toda informação que um católico típico teria de sua iconologia denominacional resumir-se-ia à transmissão oral, pressunção e memória coletiva, num período que não é exatamente conhecido pela sua boa educação. Talvez o desdém de ambas as figuras seja alimentada por uma não-iconodulia, o que é algo que, curiosamente, acontecia na época. 

A profa Margarita Voulgaropoulou tem defendido, a partir de um consistente e amplo suporte acadêmico, que a iconodulia romanista foi largamente perdida na altura do século XIII e precisou ser reintroduzida pelo contato com súditos e vizinhos melquitas. Um exemplo notório desse choque se encontra na troca de corrêspondencias do clero albanês ou epirote — a depender da sua posição sobre quem habitava a região em maiores números — durante a suserania angevina do Reino da Albânia:

"Na primeira metade do século XIII, durante o período de governo latino, o arcebispo de Ohrid, Demetrios Chomatenos, escreve para Constantinos Kavasilas, Metropolitano de Durrës: "Existem alguns latinos que não parecem completamente diferentes dos nossos costumes [...] De fato, eles também reverenciam ícones e os exibem nas suas igrejas". Enquanto Chomatenos levanta um ponto de convergência entre abordagens gregas e latinas à imagens, sua constatação implica que a prática de venerar imagens sacras não foi sempre, ou pelo menos não universalmente, adotada pela Igreja Católica" [7].

Se é necessário constatar, estamos diante de um caso consumado de corrupção doutrinária e perda da Tradição Infalível, com uma suposta iconodulia sendo ensinada pelos apóstolos apesar de desconhecida e condenada por todos os Pais da Igreja e escritores do cristianismo, que é a corrupção de uma corrupção,  que sequer dominava o globo quando foi defendida como tal, e canonizada num concílio armado e com representatividade fraudada, através de leituras deturpadas da patrística e falsificações documentais, reforçada pela queima de arquivo e um plano megalomaníaco de controle da História e da Memória; que, ironicamente, não era considerado definitivo na questão pelo próprio Papa, que previa o retorno iconoclasta ao poder da Igreja Bizantina. E essa coisa toda ainda conseguiu se perder largamente no Ocidente na Baixa Idade Média.

A correspondência do clero albanês indica um provável não-iconodulismo em Sir Geoffrey e no chamado Papa mais poderoso da história; poderoso, e herege. As ponderações deles dificilmente salvariam a iconodulia ocidental vista no século VIII ou no XXI, especialmente sob essa consideração.


O CHOQUE RELIGIOSO ENTRE OCIDENTAIS E GREGOS PROMOVIDO PELAS CRUZADAS 

Apesar de esparsa, nosso conhecimento do período não é inexistente. No século XIII, Tomás de Aquino, Felipe e um grupo nichado de escolásticos e leitores ávidos de documentos antigos era iconódula; as cantigas de Santa Maria, no século XIII, devem ser o primeiro registro de iconodulia ibérica, e é significante o uso de lendas bizantinas no seu conteúdo. Em todos esses casos, essas referências são de décadas após o estabelecimento dos Estados Cruzados na Grécia, embora a redescoberta de Damasceno, em meados do século XII, indique algum possível gérmen iconódula mínimo nos setores intelectuais ou monásticos ocidentais.


Talvez parece provável que ao menos alguém da plebe francesa tenha sido iconódula, só que provavelmente mais por superstição popular do que por transmissão conciliar: grupos hereges e proto-reformadores vão geralmente condenar a iconodulia, o que indica que eles tinham conhecimento da existência da prática entre o povo comum. Mas, devido ao próprio estado de analfabetismo e ignorância medieval, é extremamente possível que nas vésperas da Reforma Protestante fosse possível encontrar fiéis e clérigos católicos não-iconódulas. 


Com Deus e armas vitoriosas,
Pedro Gaião.
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NOTAS

[i] É extremamente recorrente a forma como apologistas romanistas sempre vão à história não pelo interesse genuíno em informação, mas para validar sua religião e, no pior dos casos, encontrar métodos de lidar com a evidência divergente para defender a religião, não raramente aderindo à própria ocultação das provas. 

É por isso que a academia secular de história medieval, onde a validação das próprias crenças é uma postura desprezível, anti-profissional e desleal para com aqueles que depositam confiança no seu trabalho, tem sido tão necessária à despeito dos milhares de possíveis argumentos que os militantes usariam para removê-la do debate confessional: sem ela estaríamos na Era do Ridículo, das trevas de Belarmino e de outros pretensiosos intelectuais que não se importavam em empenhar uma série de métodos que incluía deturpar fontes, censurar obras e matar opositores. Quem gostaria de retornar aos erros do passado?

[ii] Mas é claro! Nunca se tem o compromisso de percorrer todo o caminho e levar a verdade à sua forma primeva, sempre é necessário pausas, meios-termos, vias médias artificiais e uma dose de suposições em prol da própria posição, tanto auto-convencimento e adequação da consciência abalada, quanto refutação para seus inimigos e colegas poderem se vestir dessa suposta armadura "ainda estou certo".

Se provamos que São Tomás de Aquino negava a Imaculada Conceição, tentarão interromper a narrativa, minimizar o fato (caso já exista uma forma de "assumir a realidade e continuar sendo católico", do contrário ela vai ser negada ou posta de lado por uma série de falácias de desvio de atenção e construção/desconstrução de credibilidade e confiança) e assumir a melhor postura custo x benefício, isto é, a que cede menos na descrebilização da dialética católica e parece mais robusta. Ou seja, que Tomás se arrependeu no fim da vida e aderiu à doutrina católica — uma admissão que simplesmente ignora a alegação de que é uma doutrina de 2000 anos, ensinada pelos apóstolos e crida pela Igreja desde sempre e em todos os lugares —, que é a posição mais robusta, que cede menos e que é "a forma já existente de assumir a realidade e continuar sendo católico"; se for provado que o "arrependimento" é uma interpolação copista, o que é reforçado pelo próprio fato dos dominicanos, à exemplo de S. Tomás, terem sido historicamente conhecidos como opositores desta especulação teológica, defendida pelos franciscanos, a postura mais adotada, que tem o melhor custo x benefício e é puro suco de palpite, é a de afirmar que as discordâncias contra a doutrina foram abandonadas com a "majestosa" refutação de Dum Scotus, que não passa de um raciocínio circular; se o debate ter se prolongado ao ponto de ter sido inegável que as discordâncias continuaram — e.g. uma tentativa de homicidio de um padre franciscano contra um dominicano durante uma missa em Frankfurt (1503) — o "marco da prevalência da doutrina católica" é empurrado para mais à frente, na medida do palpite e vergonha do papista, que quase sempre afirma que ao menos na proclamação do dogma (1854) a doutrina já era consenso de fé; e que pena, não era, como os católicos mais conservadores, que se recusaram à aderir as inovações do século XIX, nos contam:

"Aderimos a Regra de Fé formulada por São Vicente de Lérins nestes termos: 'Afirmemos aquilo em que se tem acreditado em todas as partes, sempre e por todos, porque isso é verdadeiro e propriamente Católico'. Assim sendo, conservamos e professamos nossa fé nas doutrinas da Igreja Primitiva expostas nos Símbolos Ecumênicos e especificadas nas decisões dos Concílios realizados pela Igreja indivisa do primeiro milênio. 

Por isso, rejeitamos os decretos do Concílio Vaticano, que foram promulgados em 18 de Julho de 1870 relativos à infalibilidade e ao Episcopado Universal do Bispo de Roma, decretos que estão em contradição com a fé da Igreja Antiga, e que destroem sua constituição canônica, atribuindo ao Papa a plenitude dos poderes eclesiásticos sobre todas as Dioceses e sobre todos os fiéis [...] Rejeitamos o dogma da Imaculada Conceição promulgado pelo Papa Pio IX em 1854, a despeito das Sagradas Escrituras e em contradição com a Tradição dos primeiros séculos." Fonte: Declaração de Utreque (1889)

A proclamação do dogma foi fruto de tirania papal às custas da própria Tradição Papista. O que acontece com a Imaculada Conceição acontece com as imagens, como tem sido constantemente provado por nós, e por praticamente qualquer distintivo anti-bíblico papista.

[iii] 

[iv] 
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REFERÊNCIAS:

[1] SCHAFF, Philip. History of the Christian Church, Volume IV: Mediaeval Christianity. A.D. 590-1073. Grand Rapids: Christian CLassics Ethereal Library, 2002, p. 293.

[2] 

[3] GEOFFREY DE VILLEHARDOUIN. Memoirs or Chronicle of The Fourth Crusade and The Conquest of Constantinople, trad. MARZIALS, Frank T. Londres: J.M. Dent, 1908. Disponível em: <https://sourcebooks.fordham.edu/basis/villehardouin.asp>. Aceso em 4 de fevereiro de 2023.

[4] BELTING, Hans. Likeness and Presence: A History of the Image Before the Era of Art. University of Chicago Press, 1994p. 77.

[5] ENCONTRO COM ÍCONES: um encontro de oração. Ecclesia: Sacra Arquidiocese de Buenos Aires. Disponível em: <https://www.ecclesia.org.br/biblioteca/iconografia/encontro_com_os_icones_um_encontro_de_oracao.html?
fbclid=IwAR1Fn7WlG5SHofaP4yGlTFFdrAM7hwdama9NfmefMED2uqJ6iMTD9y8CsmY>. Acesso em 15 de julho de 2020.

[6] CONCÍLIO DE TRENTO, páragrafo 981. In: Montfort Associação Cultural. Disponível em: < http://www.montfort.org.br/bra/documentos/concilios/trento/>. Acesso em 5 de fevereiro de 2023.

[7] VOULGAROPOLOU, Margarita. From Domestic Devotion to the Church Altar: Venerating Icons in the Late Medieval and Early Modern Adriatic.

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